13 de março de 2011

Estágio Super-Visionado!


Sandro Reis*

Bom, gostaria de comentar algo com vocês sobre um momento importantíssimo para a formação de profissionais em saúde - o estágio curricular supervisionado.

Um momento, por vezes, mal compreendido pelos alunos, frequentemente desrespeitado pelas escolas e professores e constantemente ignorado pelos profissionais e trabalhadores em saúde. Explico.

A formação de profissionais da saúde é um tanto diferente da formação de outros profissionais. Para aqueles que escolhem seguir na área de enfermagem, por exemplo, seja a nível técnico ou de graduação, são obrigados por lei a realizarem estágio curricular (como parte do curso) para poderem praticar aquilo que aprenderam em sala de aula e conquistarem seu diploma.

E é neste ponto (o estágio) que encontramos uma série de distorções.

A lei que trata da educação no Brasil - LDB 9394/96, não diz exatamente como, quando ou onde deve ser realizado este estágio, apenas refere-se ao estágio na área da saúde como obrigatório, que seja condizente com o currículo do curso e que deve ser supervisionado por profissional qualificado.

Com isso, temos uma questão bem delicada neste momento crucial para a aprendizagem. Cada escola programa à sua maneira a forma como encaminhará seus alunos para estágio. E, sem generalizações, o que vejo na maioria das vezes são escolas programarem-se da maneira mais prática para cumprir com esta exigência de lei e não da maneira mais adequada ao aluno.

E o que observamos são supervisores de estágio sem visão à prática pedagógica e alunos mal preparados atuando em campos de estágio. A queixa maior dos supervisores de estágio é que o aluno possui dúvidas naquilo que deveria ter visto e aprendido em sala de aula mas não viu, não aprendeu. E então temos dois grupos distintos de professores: os teóricos e os práticos! Que deveriam se complementar mas se contradizem a todo momento. E os alunos, entre estes dois grupos, vão a estágio para quê? Pasmem! Lidar com vidas humanas, em seu momento mais frágil - a doença, o sofrimento, a morte etc...

Quando recorremos ao dicionário Houaiss ele nos define supervisionar como o ato de "dirigir inspecionando um trabalho", uma tarefa, um procedimento. Ora, então podemos definir supervisor de estágio como aquele que conduz um aluno ao ato de realizar procedimentos e inspeciona a maneira com que são feitos. Por isso é que a quantidade de alunos em estágio é definida por lei (Lei 11.788/2008)- no máximo dez (10) para cada supervisor de estágio, dada a responsabilidade de inspecionar cada tarefa, cada procedimento realizado por seus aprendizes. Que as escolas, com 300 alunos para encaminhar para estágio desrespeitam.

E partimos da proposição que enquanto supervisor de estágio, por definição não tem o papel de ensinar, mas apenas de supervisionar! Ou tem?

O fato é que cada vez mais observamos alunos que não aprenderam a simples regra de três ou a complexa diferença entre pressão sistólica e pressão diastólica sendo "jogados" em campo... de estágio! - "O quê? O que são milímetros de mercúrio? Por que pressão se afere em mmHg?"



Seria como colocar um jogador em um jogo profissional sem que lhe tenha ensinado as regras básicas do futebol. - "O que é impedimeno? O que é escanteio?"

A necessidade de um processo de aprendizagem onde a práxis é vista como o processo de colocar em prática aquilo que foi visto em teoria é fundamental neste processo de formação do profissional, principalmente na área da saúde.

Mas vários alunos, em campo de estágio, não aprenderam o básico para irem para o estágio, e ainda assim vão! Assim, frequentemente o professor-supervisor-de-estágio se vê na dificil tarefa de avaliar, supervisionar, inspecionar a execução de um procedimento que o aluno diz não ter visto em sala de aula!!!!!???

E então? Deve-se interromper neste momento todo o processo de Estágio, de Práxis e retrocedermos o aluno ao nível intelectual de uma sala de aula que trate deste assunto? Ou continuamos com o processo dando uma pequena explicação técnica e seguimos com o procedimento? Segue-se em frente...

Temos um movimento que ocorre com certa frequência nos grandes centros: Muitas escolas, muitos alunos e poucos campos de estágio e poucos professores preparados que por sinal passaram também por este processo em que as escolas se degladiam pela própria competição mercantil e também para conseguirem campos de estágio - cada vez mais restritos. Afinal é lei!

Ainda assim, há neste processo os professores-supervisores que se furtam da responsabilidade de formação responsável assumindo os estágios apenas como uma necessidade de renda extra. E na ponta deste processo estão os alunos e pacientes sendo concomitantemente vítimas e produtos deste processo de (de)formação profissional.

O Conselho Federal de Enfermagem - Cofen através da resolução - COFEN Nº 299/2005 - em seu artigo 5º diz que o aluno deve estar apto para ser encaminhado ao campo de estágio supervionado e somente pode ser encaminhado ao campo de estágio após passar pela fundamentação básica de enfermagem. A mesma resolução em seu artigo 7º ainda redefine a quantidade de alunos que devem ser encaminhados ao campo de estágio conforme o nível de assistência ao paciente - mínima/intermediária/semi-intensiva e intensiva.

Na prática, neste momento crucial para a formação profissional - o estágio - é cada vez mais frequente e evidente o despreparo destes alunos, das escolas, dos professores e também das instituições cedentes dos campos de estágio.

E o que vimos e ouvimos na mídia são profissionais de enfermagem instalando conectores de oxigênio em acessos venosos, que infundem vaselinas liquidas e dietas enterais em vias endovenosas, etc. causando enormes prejuízos às vidas que deveriam cuidar.

Tentando minimizar estes efeitos na formação profissional em enfermagem o Coren SP lança uma campanha de Exercício Profissional Tutelado. Ficamos na torcida para dar certo... mas devemos aceitar que a responsabilidade é de todos nós!


* Especialista em Gestão de Sistemas de Saúde pela FCM/Unicamp. E especialista em Educação Profissional em Saúde.

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